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Mães de UTI


Conhecemos a Karla Karolliny hoje no Hospital do Coração (HCor). A Tempo de Brincar esteve lá celebrando o Dia das Mães. Entre um grupo de mais de 15 mães, uma delas pede que Karla leia em voz alta o texto que produziu sobre a rotina com o filho com problemas cardíacos hospitalizado, pois representa o que todas elas sentem. É o texto que publicaremos a seguir.

Karla veio de Wanderlândia, no Tocantins. Descobriu que o filho teria uma cardiopatia já no ultrassom morfológico. Encaminhada para fazer uma ecocardiografia fetal em Goiânia (GO), pois sua cidade não dispõe do equipamento para tal, soube que a cardiopatia era bastante grave: Síndrome de Hipoplasia do Ventrículo Esquerdo. Significa que o lado esquerdo do coração é subdesenvolvido, sendo incapaz de exercer sua função. Rara, representa 2% dos casos de cardiopatia congênita e exige uma série de cirurgias.

Sérgio Gabriel fez sua primeira cirurgia com dois dias de vida, e amanhã, dia 16, completa um mês.

"Todos os dias ao acordar peço força a Deus pra enfrentar mais um dia em uma UTI, às vezes nos falta coragem pra chegar, com receio das notícias noturnas, e o coração acalma quando avisto meu pequeno, parecendo uma placa-mãe, como o papai mesmo já comparou, tantos fios e tantos monitores conectados, quanta agonia com isso. O desespero às vezes bate, pois me sinto impotente, ao mesmo tempo que o filho é meu, sinto como se não fosse, pois não posso fazer nada pra aliviar suas dores, seu sofrimento, não posso sequer pegá-lo no colo pra afagar em meu peito e tentar amenizar a sua agonia, sensação de impotência só aumenta.

Os dias por aqui são assim, tantos sustos com os bips dos monitores, as pernas gelam quando a equipe médica se aproxima pra falar sobre o boletim, quantas vezes já me debrucei sobre o berço do meu filho clamando um milagre pra Deus, derramando lágrimas, sem forças pra nada. Não é fácil ver tantos hematomas em um Serzinho tão pequeno, lutando pra viver, tantas injeções diárias, medicações, ficamos tão ligadas ao mundo da UTI que esquecemos a hora de comer, beber e ir ao banheiro, simplesmente o mundo externo não existe.

Aqui encontramos olhares profundos e cansados das outras mamães, uma tentando passar força pra outra, e de repente as lágrimas se misturam, as dores são profundas e o sentimento compartilhado é o mesmo, quando estamos aqui o tempo de espera parece não passar, cada segundo é uma eternidade e pensamos o que será que está acontecendo lá dentro? O coração vai até a garganta e volta, e finalmente quando é dada a hora da visita o responsável pela UTI fala: "mãezinha você não pode entrar agora, seu bebê está fazendo procedimento", novamente seu coração sai do lugar e por segundos passa filmes em sua cabeça, qual procedimento? Para que? E porque? Nada te acalma e nada tem resposta.

Alguns dias são bem mais difíceis que os outros, quando seu filho não reage, quando os médicos dizem que a situação do seu bebê é gravíssima e que a única forma de não perdê-lo é se ele passar por um procedimento cirúrgico de alto risco, "mamãe, papai não saiam, vocês precisam assinar o termo de responsabilidade" como dói, é a base do tudo ou nada. Por aqui temos que fazer a oração do xixi, do cocô, do fígado bom, do coração reagindo, da pressão, tudo é oração, passamos a dar valor a coisas tão pequenas, 1 ml de leite a cada 6 horas, 15 ml de xixi, nossa maravilha, aprendemos a ter paciência. Passos de tartaruga? Não. De formiga, dois passos pra frente, 3 pra trás, e aprendemos que cada dia é uma Vitória, mesmo em meio às intercorrências, aprendemos que tamanho não é documento, pois nos deparamos com marmanjos chorando, e pequenos lutando pra se manter vivo, e lutando com tanta força, meu guerreiro hoje é meu grande professor, meu coração Valente mesmo sedado me passa força, coragem...

Hoje encontrei outra família, o porteiro do hospital, os recepcionistas, enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas, técnicos de enfermagem, responsáveis de setores, médicos e as outras famílias, por aqui encontrei vovôs e vovós batalhadores, irmãos corajosos, pais heróis e mamães guerreiras. Hoje aprendemos a esperar os milagres, hoje sabemos que o tempo não é nosso, e temos que respeitar o tempo do outro e aceitar o tempo de Deus, hoje eu deixei de sonhar e passei a viver o sonho que Deus preparou pra mim, e posso dizer mesmo com todas as dificuldades, mesmo com tantas lágrimas e desespero, eu tenho que agradecer pelo nosso milagre, nosso meio coração amado por inteiro".

Karla Karolliny Valadares Bilio

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